terça-feira, dezembro 15, 2009

Cartas do Céu (ou 11:33 Parte II)



Há um dia em que o céu se abre e cartas com a palavra Liberdade caiem dele e eu realmente esperei por elas. O tempo passou e tu nunca te foste embora, estiveste sempre aqui comigo – nos meus lençóis, na água do chuveiro, nos livros e em todas as músicas. Tu morreste e eu continuei a ver-te aqui, a falar contigo e a dormir a teu lado: debaixo do teu abraço e encaixado no teu regaço. Eu nunca deixei que tu partisses e de facto tu não te foste, o teu fantasma esteve durante este tempo todo a assombrar-me; a vida não podia continuar sem ti, então eu trouxe-te – eu mantive-te vivo: dentro de mim, nos meus sonhos e até nas minhas histórias.

Nunca consegui perceber as tuas perturbações, nunca consegui entender o que te faz querer destruir uma pessoa desta forma – assusta-me que na tua idade já tenhas quebrado tantos corações e que saibas fazer isso duma forma implacável como ninguém conhece. Eu não queria, mas tu mataste-te, ou talvez nunca tenhas existido – eu fui engolido pela mentira e tu comeste-me com todos os dentes que tens na boca – talvez foste invenção da minha cabeça, talvez eu vi-te como gostava que tivesses sido. És uma alucinação que a cultura POP criou em mim: não existem pessoas como tu.

Quando morreste quis morrer contigo, não quis aceitar a verdade do Mundo, não quis aceitar que o Amor é uma Liberdade, não quis ver que tudo que desenhaste para mim não era meu afinal. Havia mais como eu (eu não fui o amor da tua vida), eu juntei-me a uma lista imensa que a tua morte guarda com orgulho no coração. Quantas vezes já morreste tu? Quantas pessoas já destroçaste tu? Quantas vidas vais ainda afectar?

Aquele que aparece quando morres não tem nada de ti, tem os olhos hábeis e apurados, os lábios sedentos de sangue e um faro incrível para presas. Não tem os teus olhos mel de apaixonado, nem os teus lábios carnudos que me ofereceste um dia (só para mim) e nem sequer cheiravas outro perfume que não fosse o meu. Ás vezes ainda sonho que estás vivo – acordo a chorar e com o peito apertado de saudades tuas – e outras sonho que aquele que te matou me culpa pela tua morte – aí acordo a gritar e destruído por tais palavras.

A vida não é tão longa como parece e eu não posso continuar a brincar aos amigos imaginários; ultimamente faço um esforço por te desencontrar e senti o teu braço sobre mim quando durmo muito mais apagado, senti as tuas palavras que ecoavam na minha cabeça num dialecto que me é desconhecido e quando a água do chuveiro caiu em mim não senti o teu toque e o teu corpo colado ao meu; os livros deixaram de me fazer acreditar em ti e passaram a ensinar-me o que é a vida e as músicas já não cantam sobre ti – cantam sobre mim.

Eu sou o protagonista da minha história e eu vou fazer o meu Destino longe de ti, tu morreste e está na hora de eu viver a sério pela primeira vez: porque há mais de meio ano que o meu coração tem saltado batimentos e já não me lembro o que é senti-lo bater de verdade. Por isso hoje de manhã abri os olhos olhei o céu e vi que o Sol lá estava (finalmente), estavas a meu lado com a tua cara de protector e eu olhei com mais atenção – era uma carta que voava em direcção a mim; agarrei-a com as mãos e pude ler com todas as letras a palavra Liberdade, o ar pareceu leve de novo e o meu coração descongelou: senti-o bater. Quando voltei a olhar para ti já lá não estavas, tinhas morrido duma vez por todas e eu jurei nunca mais te deixar entrar no meu Lugar, porque há um dia em que o céu se abre e cartas com a palavra Liberdade caiem dele – hoje eu recebi a minha.

1 comentário:

Vera Matias disse...

Hoje foi o dia.
Vamos ser tão mais felizes @